O dia das crianças de quem não pode ser mais criança

In Cultura, Geral

Um dos maiores problemas sociais continua assolando o mundo todo. Hoje, a exploração de crianças ainda é uma triste realidade em vários países, incluindo o Brasil.

Laura Rezzuto

A pobreza familiar, a exploração de empresas, o abuso doméstico e até mesmo a frase “o trabalho enobrece” são elementos que levam uma criança à obrigação de  tomar decisões difíceis, como largar uma boneca, a bola e os estudos para sobreviver. Para muitos, ousar deixar tudo para trás e virar gente grande, é a única forma de garantir a próxima refeição. 

Porém, escolher viver dessa forma, não apenas rouba o lazer, o estudo e os brinquedos, mas, também, um sorriso. Segundo dados do IBGE, só no Brasil, cerca de 1,8 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos trabalham na agricultura, no comércio, em serviços domésticos ou em indústrias. 

A cultura de ‘aceitação’ do trabalho infantil

Levantar cedo, tomar o café da manhã em família, ir à escola, ficar ansioso pela educação física, passear pelo shopping, ser ouvido, entendido, orientado e recebido com carinho. Rotina da maior parte das crianças, mas que está longe de ser a realidade de milhares.

Dormir muitas vezes sem um teto, se arriscar por pouco e pensar que segurança ou esperança é um luxo que não cabe no seu roteiro do dia. É assim que, na verdade, funciona o dia a dia de quem desde pequeno trabalha para pôr o pão na mesa. Crianças que têm apenas um alvo: suprir a necessidade da sua família. 

Iara Silva é assistente social há 20 anos e conta sobre a importância de uma rotina equilibrada, que dá prioridade aos estudos e demais atividades infantis. “É importante ter costumes bem formados e idealizados, as crianças precisam conseguir melhorar a sua forma de caminhar na jornada educativa e no dia a dia, com disciplina e consciência. Para que assim possam ter segurança em cada passo que derem, sem medo das derrotas e conquistas que certamente poderão refletir no futuro”, explica. 

Já para Guilherme Farias, assistente social da Casa da Criança, o trabalho infantil é uma cultura que ainda não foi quebrada no país. “Às vezes nós olhamos uma criança no sinal que limpa vidro, vende bombons ou faz malabarismo e pensamos ‘que pena, tão pequeno e se esforçando para comer. Mas antes fazendo isso do que roubando. E isso é o que vemos nos sinais, e as que estão trabalhando em locais que nem às remuneram?”, questiona Guilherme.

Malefícios da jornada

Crianças e adolescentes possuem uma noção inferior à dos adultos, por isso, acabam tendo menos ideia do que existe ao seu redor. Analisando isso, é possível entender que o manuseio de ferramentas de trabalho e equipamentos não foram projetados para uma miniatura de ser humano. Esse é apenas um dos motivos pelo qual uma criança não deve trabalhar, já que fica sujeita a sofrer acidentes ou ser mais facilmente explorada por quem devia cuidar dela, segundo a psicóloga infantil Keula Thaise. 

“Pôr as crianças nesse mundo de pressões do trabalho gera diversos problemas para ela, como transtornos, insônia, irritabilidade, problemas de saúde, etc. Essas coisas acabam afetando diretamente a educação, o que gera um rendimento escolar ruim. Elas não têm um sistema nervoso formado, então ficam mais propensas a cair no poço da ansiedade e depressão”, enfatiza a psicóloga.

Esperanças que restam por meio do trabalho

Segundo Guilherme Farias, que sempre quis conquistar suas coisas desde cedo, o trabalho durante a infância pôde suprir as suas necessidades, mas também deixou prejuízos no trajeto. “Aos 12 anos eu tinha uma carga horária e inúmeros trabalhos para cumprir, por isso aprendi desde cedo como era trabalhar para ter o seu. Além disso, eu superei as dificuldades que tinham no meu caminho, mas os meus irmãos preferiram abandonar os estudos”, finaliza.

Crianças que se submetem ao trabalho desde cedo, de fato, não enfrentam só possíveis problemas que podem ter no futuro, mas também, o abuso psicológico e a exploração sexual. Esse é o caso de uma pré-adolescente de 13 anos, que preferiu não revelar seu nome.

“Eu trabalho em uma loja de roupas no centro aqui de Manaus e também vendo brigadeiros, como muitas meninas da minha idade que precisam ajudar em casa”, conta a menina. 

Ela relata que é comum ser abordada por homens na rua em que trabalha. “Eles começam com: quanto você quer? a gente passeia só uma vez. Vai ser rápido. Você nem precisa ficar trabalhando nessa loja, pode ganhar mais”, lembra.

A garota não só precisa lidar constantemente com o assédio e a sobrecarga do seu trabalho, como também precisa conciliar ele com a escola, na qual já reprovou duas vezes desde que começou a trabalhar. “Não tem jeito. Às vezes eu preciso faltar para fazer hora extra, trabalhar em algum feriado, como no dia das crianças ou então cumprir a minha carga horária, se não, não me pagam”, desabafa. 

A história desta garota, não precisa ser a de outras.No Brasil, o trabalho infantil pode ser combatido de inúmeras formas, por meio de grupos que lutam pelos direitos humanos e denúncias contra esse tipo de crime, por exemplo.

Hoje, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) realiza fiscalizações e pesquisas ao redor do mundo. Graças a ela, projetos já foram criados para estimular adultos e jovens a lutarem, conscientizando assim, através de treinamentos a população e profissionais que tem um objetivo em comum, garantir o fim do trabalho infantil.

Trabalho infantil faz parte do Dia das Crianças.
O trabalho infantil é realidade para muitas crianças.

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