Pollyana Paraguassu, mãe solo de três filhos, inspira e apoia diversas famílias ligadas ao Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Gabrielle Ramos
Numa jornada marcada por desafios e superações, a trajetória de Pollyana Paraguassu, atualmente presidente da Associação dos Amigos dos Autistas do Espírito Santo (AMAES), teve início ao enfrentar de perto os desafios do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Como mãe solo de três filhos, um deles com TEA, ela se deparou com uma realidade na qual o autismo ainda não era oficialmente reconhecido como uma deficiência.
Devido a esse contexto, Pollyana decidiu buscar auxílio para seu filho e fez isso ao se voluntariar na AMAES. Há dez anos, assumiu a gestão da instituição com o objetivo de ajudar outras famílias, especialmente aquelas menos privilegiadas em termos de acesso. Ela relata que o que começou com 48 famílias assistidas e quatro funcionários, hoje se transformou em um movimento que envolve mais de 80 colaboradores, seis unidades e atende cerca de 1.500 famílias.
Gabrielle Ramos: O que motivou o seu envolvimento na defesa dos direitos dos indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA)?
Pollyana Paraguassu: O que me levou à instituição foi o diagnóstico do meu filho; caso contrário, é provável que eu não estivesse fazendo isso hoje. Nós agregamos amigos, parceiros, mas geralmente os que estão mergulhados, em sua maioria, são pessoas que de alguma forma estão relacionadas à causa. […] Eu falo que hoje eu luto pelo meu filho, mas também luto muito mais pelos outros, para que a pedra que eu pisei, outra pessoa não pise e, caso pise, doa menos do que doeu em mim.
GR: Como a AMAES contribui para a sociedade?
PP: Eu falo que a AMAES é muito mais do que uma instituição; é mais do que um local que presta serviço e atendimento. É um espaço acolhedor, humanizado, onde as famílias têm a sensação de pertencimento. Pois quando você se sente pertencente, você luta por isso. […] Aqui, nós somos as vozes dos nossos filhos. Eu falo isso aonde quer que eu vá: o diagnóstico não é do autista, é da família.
Hoje, a AMAES funciona da seguinte forma: na área da educação, nós temos um programa de contraturno, no qual as crianças que não estão na escola frequentam a instituição. Nosso objetivo não é oferecer reforço, mas habilitá-los para que estejam dentro da sala de aula. Na área da saúde, temos uma equipe com médicos, psicólogos, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais. Também oferecemos oficinas e acompanhamento por assistentes sociais, um acolhimento do autista e da família, de modo geral. […] Os atendimentos são de forma gratuita porque são mantidos através de patrocínio ou por recursos públicos.
GR: Quais são os principais desafios enfrentados na promoção da conscientização sobre o TEA?
PP: O capacitismo, mas mudar esta cultura não é fácil e leva tempo. […] Eu já briguei muito, já ‘bati boca’, mas hoje, eu prefiro passar a informação. Porque a partir do momento que a pessoa estiver informada, ela vai informar outra; funciona como uma corrente. Então, só através da disseminação de informações, a gente vai levando conhecimento e vai diminuindo o preconceito que existe com o autismo.
Além disso, o que mais falta é que as políticas públicas sejam efetivadas. Temos várias leis, mas hoje, especialmente, precisamos que essas leis sejam fiscalizadas e cumpridas. […] Também necessitamos de educadores, mas educadores no sentido amplo da palavra, não apenas professores. Educadores que realmente possam informar e conscientizar sobre esse processo de construção de políticas públicas como um todo.
GR: O que é possível fazer para amenizar ou solucionar estas problemáticas?
PP: Eu acredito que a informação e a conscientização são a maior ‘carta’ que temos. Quando eu passo uma informação, eu levo uma conscientização. Durante minhas palestras, costumo dizer que, podem ter 100 pessoas; se eu conseguir plantar a semente em uma, eu saio feliz, porque aquela vai passar para outra. Hoje é meu filho, mas amanhã pode ser o filho ou neto de qualquer um. Então, todos nós temos que estar preparados também.
GR: Como os cidadãos que não estão diretamente envolvidos na causa podem contribuir na conscientização?
PP: A divulgação é importante para abrir espaços que hoje estão fechados. Nós precisamos romper os muros das instituições […] e, para isso, precisamos melhorar. Um exemplo disso é informar sobre o uso do cordão de girassol, para que as pessoas possam saber que aqueles que o utilizam têm uma deficiência oculta ou invisível.
Eu sempre falo que, quando vemos uma postagem falando sobre uma lei, precisamos compartilhar, pois hoje o mundo está virtual; temos ele na palma da nossa mão. Assim, podemos instigar o poder público para que ele cumpra o que está na lei, para que a gente não precise ficar ‘mendigando’ aquilo que já está determinado.
GR: De que maneira você acredita que sua jornada pessoal está influenciando positivamente a percepção da sociedade em relação ao TEA?
PP: Quando você recebe o diagnóstico de autismo para o seu filho, é como se um buraco se abrisse, porque durante a gravidez, nós [mães] criamos expectativas e sonhos para o nosso filho. Muitas vezes, imaginamos em que ele vai se formar. Mas, de repente, vemos que não é bem assim.
Talvez hoje eu não estaria contribuindo com outras famílias se não tivesse o meu filho dentro da minha casa. Hoje, ele é a minha inspiração para que eu possa transformar a vida de outras pessoas. E o que eu, porventura, não consegui fazer por ele, por pressão de lei ou outro motivo, há agora outros que podem realizar. Então, é [reconfortante] saber que nós fazemos parte e deixamos um legado de amor ao próximo, união e empatia.